sábado, 22 de outubro de 2016

UM COMUNA AZEDO E O SOCIALISTA AMARGO

O senador Valadares, político que nunca foi agressivo, muito menos grosseiro ou deselegante, vem perdendo, infelizmente, aquelas características de cordialidade que o diferenciavam. No calor dessa acirrada campanha, quando o quadro de favoritismo que desenhou para o seu filho começa a desfazer-se, o senador tornou-se amargo e intolerante. Depois de chamar de “covarde e traidor” um amigo e aliado, Belivaldo Chagas, com o qual esteve lado a lado durante mais de 30 anos, Valadares investiu agora contra Edvaldo Nogueira, adversário do seu filho, chamando-o de “Comuna azedo de raiva”. Além do destempero, Valadares demonstrou preconceito e desconhecimento lamentável das ideias políticas, e do que essas ideias representaram ao longo da História. Logo ele, que agora se intitula socialista!

O preconceito e a intolerância só cabem nas pessoas que não se libertam do sentimento frustrante de amargura e rancor.

Se em 1964 o senador Valadares se intitulasse socialista, iria parar na cadeia. Naquele tempo, um time de futebol, o Socialista, teve compulsoriamente de mudar de nome, tornando-se então Maruinense.  O jornal Gazeta Socialista, antes já trocara de nome para Gazeta de Sergipe, mas, mesmo assim, o raivoso major Raul, quase concretiza a ameaça de jogar “na maré” as suas subversivas máquinas de escrever e imprimir.

Felizmente, o senador Valadares tornou-se socialista em tempos mais amenos. Soube, precavidamente, esperar o momento propício para fazer a nova opção, que o ajudou a refazer-se politicamente.

“Comuna”, nos tempos em que mais se acirrava o embate ideológico, era a maneira pejorativa como extremados, raivosos, denominavam a todos os que não pensavam como eles. Depois da queda do Muro de Berlim esse conflito perdeu sentido, tornou-se fora de moda. O clima de guerra fria só é revivido por oportunismo, ignorância ou descompasso com o passar do tempo. A palavra comuna, para quem conhece um pouco a História, traduz um objetivo que enobrece a raça humana.

Na Idade Média foram surgindo as comunas, juntando trabalhadores, camponeses, ou urbanos, e essas novas associações, em alguns casos, aliaram-se aos senhores da terra, em outros, romperam as amarras do feudalismo e criaram as cidades livres na costa báltica da Alemanha, transformadas em grandes centros de comércio. Os formuladores dos modelos de sociedades perfeitas, como Thomas Morus, Robert Owen, Tomaso Campanela, em seu livro póstumo A Cidade do Sol, Fourrier, e seus falanstérios, Saint-Simon e a ideia de produzir mais com menor esforço e liberdade, todos eles, alimentaram os sonhos tendo como base a estrutura solidária das comunas.

A Comuna de Paris em 1871, foi a primeira experiência moderna de cogestão e avanços sociais, alguns ousadíssimos e rejeitados, outros, agora vigentes nas sociedades modernas, a exemplo das sociais-democracias europeias. Disse o escritor Rougerie: “Com a Comuna a Utopia passou a existir na prática”. Mas a Utopia durou apenas 72 dias.

O mesmo aconteceu na Espanha, durante a matança da Guerra Civil, quando as comunas andaluzes e de tantas outras regiões, faziam experiências incríveis, entre elas a abolição do dinheiro.

Socialista, o senador Valadares já olhou com simpatia os movimentos sociais, as transformações ocorridas ao longo da História, para as quais a participação dos socialistas foi importante. Pode ser que agora, cercado pelas novas companhias, ele esteja pensando transferir-se para uma nova sigla, que faz parte da base de apoio ao seu filho candidato. Lá, no meio da sua turma hoje preferida, ele talvez se adaptasse melhor, trocando o Partido Socialista Brasileiro pelo PSC, onde estão o intolerante, truculento Bolsonaro, o pastor Feliciano, inventor da “cura gay”, e, last  but not least, o deputado André Moura. Agora, incorpora-se ao grupo de apoiadores do filho do senador, o energúmeno Silas Malafaia. A raiva que ele extravasa é contagiosa.

Talvez vivendo esses tempos de algum inconsciente constrangimento, o senador que foi cordial, se transfigura, mostra a face ríspida, pouco amistosa, e trata do embate político como se fosse uma guerra pessoal, que ele terá de vencer. Com muita raiva, se for preciso.


Será que o senador Valadares ainda não descobriu que a raiva é a prisão de ventre e hemorroida da alma?

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