O senador Valadares, político que nunca foi
agressivo, muito menos grosseiro ou deselegante, vem perdendo, infelizmente,
aquelas características de cordialidade que o diferenciavam. No calor dessa
acirrada campanha, quando o quadro de favoritismo que desenhou para o seu filho
começa a desfazer-se, o senador tornou-se amargo e intolerante. Depois de
chamar de “covarde e traidor” um amigo e aliado, Belivaldo Chagas, com o qual
esteve lado a lado durante mais de 30 anos, Valadares investiu agora contra
Edvaldo Nogueira, adversário do seu filho, chamando-o de “Comuna azedo de
raiva”. Além do destempero, Valadares demonstrou preconceito e desconhecimento
lamentável das ideias políticas, e do que essas ideias representaram ao longo
da História. Logo ele, que agora se intitula socialista!
O preconceito e a intolerância só cabem nas
pessoas que não se libertam do sentimento frustrante de amargura e rancor.
Se em 1964 o senador Valadares se intitulasse
socialista, iria parar na cadeia. Naquele tempo, um time de futebol, o
Socialista, teve compulsoriamente de mudar de nome, tornando-se então
Maruinense. O jornal Gazeta Socialista,
antes já trocara de nome para Gazeta de Sergipe, mas, mesmo assim, o raivoso
major Raul, quase concretiza a ameaça de jogar “na maré” as suas subversivas
máquinas de escrever e imprimir.
Felizmente, o senador Valadares tornou-se
socialista em tempos mais amenos. Soube, precavidamente, esperar o momento
propício para fazer a nova opção, que o ajudou a refazer-se politicamente.
“Comuna”, nos tempos em que mais se acirrava
o embate ideológico, era a maneira pejorativa como extremados, raivosos,
denominavam a todos os que não pensavam como eles. Depois da queda do Muro de
Berlim esse conflito perdeu sentido, tornou-se fora de moda. O clima de guerra
fria só é revivido por oportunismo, ignorância ou descompasso com o passar do
tempo. A palavra comuna, para quem conhece um pouco a História, traduz um
objetivo que enobrece a raça humana.
Na Idade Média foram surgindo as comunas,
juntando trabalhadores, camponeses, ou urbanos, e essas novas associações, em
alguns casos, aliaram-se aos senhores da terra, em outros, romperam as amarras
do feudalismo e criaram as cidades livres na costa báltica da Alemanha,
transformadas em grandes centros de comércio. Os formuladores dos modelos de
sociedades perfeitas, como Thomas Morus, Robert Owen, Tomaso Campanela, em seu
livro póstumo A Cidade do Sol, Fourrier, e seus falanstérios, Saint-Simon e a
ideia de produzir mais com menor esforço e liberdade, todos eles, alimentaram
os sonhos tendo como base a estrutura solidária das comunas.
A Comuna de Paris em 1871, foi a primeira
experiência moderna de cogestão e avanços sociais, alguns ousadíssimos e
rejeitados, outros, agora vigentes nas sociedades modernas, a exemplo das
sociais-democracias europeias. Disse o escritor Rougerie: “Com a Comuna a
Utopia passou a existir na prática”. Mas a Utopia durou apenas 72 dias.
O mesmo aconteceu na Espanha, durante a
matança da Guerra Civil, quando as comunas andaluzes e de tantas outras
regiões, faziam experiências incríveis, entre elas a abolição do dinheiro.
Socialista, o senador Valadares já olhou com
simpatia os movimentos sociais, as transformações ocorridas ao longo da
História, para as quais a participação dos socialistas foi importante. Pode ser
que agora, cercado pelas novas companhias, ele esteja pensando transferir-se
para uma nova sigla, que faz parte da base de apoio ao seu filho candidato. Lá,
no meio da sua turma hoje preferida, ele talvez se adaptasse melhor, trocando o
Partido Socialista Brasileiro pelo PSC, onde estão o intolerante, truculento
Bolsonaro, o pastor Feliciano, inventor da “cura gay”, e, last but not least, o deputado André Moura. Agora,
incorpora-se ao grupo de apoiadores do filho do senador, o energúmeno Silas
Malafaia. A raiva que ele extravasa é contagiosa.
Talvez vivendo esses tempos de algum
inconsciente constrangimento, o senador que foi cordial, se transfigura, mostra
a face ríspida, pouco amistosa, e trata do embate político como se fosse uma
guerra pessoal, que ele terá de vencer. Com muita raiva, se for preciso.
Será que o senador Valadares ainda não
descobriu que a raiva é a prisão de ventre e hemorroida da alma?
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