A SOLIDARIEDADE
MINEIRA E
A SOLIDARIEDADE
SERGIPANA
Dizem, que
foi Otto Lara Rezende o autor da frase: ¨ Mineiro só é solidário no câncer.¨ O
escritor nascido nas Minas Gerais, grande
frasista, como tantos outros da sua geração, veio tornar-se famoso no Rio de Janeiro, desculpava-se, e dizia que embora não
discordando completamente do significado
da afirmação a ele equivocadamente atribuída, recusava a autoria, até por
acreditar que aquele jeito mineiro de ser, definido como ¨mineirice¨ guardava, na sua essência, uma forma de convivência solidária.
Lembrando da frase que restou condenada a uma insolúvel
orfandade, um político sergipano que já foi
há muito tempo, no dizer de Machado de Assis, ¨estudar a geologia dos
campos santos ¨, ampliava o seu conteúdo,
acrescentando: ¨e o sergipano nem nesse caso.¨
Ao reforçar a frase definidora, com exagero, do caráter dos mineiros, tornando-a ainda mais
áspera em relação à maneira de ser dos sergipanos, o político, batido por
desagradáveis experiências, ressentido com atitudes que classificava como traições, apenas externava uma mágoa que deformava, a nunca posta em causa generosidade dos
nascidos na província de Sergipe D`Del Rei.
O sergipano não é mais nem menos
cordial ou solidário, da mesma forma o
mineiro, do que toda a gente brasileira.
Este país onde nunca prosperaram por muito tempo os extremismos, é a grande
nação onde convivem lado a lado, pacifica e harmoniosamente, povos, etnias,
religiões, que em outros cantos do
planeta andam a se exterminar mutuamente em infindáveis carnificinas.
Sergipe faz parte deste país no qual Buarque de Holanda identificou os
traços marcantes de uma cordialidade que pode ser entendida também como
generosa espontaneidade para conviver,
desfazendo sempre aquela barreira que separa as pessoas, tornando-as inimigas, ou, no
mínimo permanentemente desconhecidas uma das outras.
Em Sergipe, faz muito tempo, a
política deixara de ser praticada com
radicalismo e ódio. Sobre aqueles tempos que já vão longe, o procurador
de Justiça aposentado Jose Gilson dos Santos, acaba de escrever um livro onde
conta tantos episódios da forma truculenta
de se fazer política, que na
verdade foi uma violenta deformação do comportamento moderado e pacífico dos sergipanos.
Gilson não conta um episódio
ocorrido naquele tempo, a demonstrar o potencial do ódio que contaminou a
política sergipana. Aqui o relembramos: Numa emissora de rádio um famoso
radialista com entonação de voz que não
escondia a satisfação, anunciou em horário líder em audiência: ¨Atenção,
atenção, muita atenção para esta notícia. O jornalista Orlando Dantas e
usineiro falido, viaja hoje ao Rio de
Janeiro buscando tratamento para um câncer que lhe apareceu exatamente no ânus.
¨ E finalizava com uma gostosa risada.
Detalhe: o jornalista, na ocasião, tinha
excelente saúde.
Mais de meio século transcorrido, programas em algumas emissoras sergipanas,
andam quase a imitar aquele episódio.
Mesmo naqueles tempos de disputas extremadas, os homens públicos não perdiam o senso de responsabilidade, quando necessário, se entendiam no Rio de
Janeiro, então capital da República, cumprimentavam-se, sentavam para conversar
e trocar ideias sobre a melhor forma de servir a Sergipe, de atender as
demandas do estado.
Quando Lourival assumindo o governo em 67 fez um apelo para
que os políticos se desarmassem, literalmente, tirando os 38 da cinta, a
odiosidade entre os protagonistas da cena política sergipana foi desaparecendo,
embora, naquele tempo, começasse a aumentar a truculência do regime
contra as liberdades democráticas e os direitos humanos . Houve então o
registro de fatos que servem para exaltar a índole das lideranças políticas
sergipanas, que contiveram, na medida do possível, a onda de perseguições. Para
isso, muito contribuíram políticos marcadamente conservadores, como Celso de
Carvalho, Lourival Baptista, Jose
Rolemberg Leite, Paulo Barreto de Menezes, João Andrade
Garcez, Augusto Franco, Djenal Tavares
de Queiroz, João Alves Filho, que governaram Sergipe em tempos bravos ou amansados da ditadura. Esse registro se faz como depoimento que engrandece a história política sergipana, que nunca perdeu,
completamente, o elo da convivência e o sentimento de respeito entre
adversários.
O sergipano não destoa da índole
brasileira, e ontem, como hoje, apesar de tudo, continua cultivando
os mesmos hábitos cordiais, os mesmos sentimentos de solidariedade, a mesma
capacidade de conviver, pacífica e respeitosamente, em meio a todas as divergências.
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