¨ MENAS CHAMPAGNE
MINHA GENTE ¨
Fazia-se, antes, o assalto aos cofres públicos com um
certo recato, algum comedimento na forma
de agir. Mas, lá se foram os tempos dos ladrões de casaca, a coisa não apenas vulgarizou-se, na verdade,
avacalhou-se a prática da subtração
indevida do alheio. Antes, precaviam-se
os senhores de colarinho branco, que atuavam
obedientes ainda a uma liturgia
distante da promiscuidade. Afinal, peculato é algo reservado aos que detêm o privilégio de um cargo público. Distinguem-se,
portanto, dos simples
larápios, cujo raio de ação não alcança
a área exclusiva dos cofres públicos, estes, esvaziados apenas por
quem deles possui as chaves, e, por isso mesmo, não são ladrões comuns, são
definidos com nome especial: peculatários. Alguns desses peculatários ainda desfrutam
da prerrogativa singularíssima do foro especial. Em assim sendo, esperava-se dessas
pessoas assim tão distintas, tão
qualificadas, que assumissem um comportamento pelo menos condizente com o tipo
de roubo que praticam.
A quadrilha do Cacheira e do seu sócio o senador Demóstenes , conseguiu a proeza de aviltar a indecência.
Não se sabe se foram excessivamente ousados, imprevidentes, ou teriam
se imaginado inatingíveis, tal era o poder que ostentavam. O certo é que
Cacheira e Demóstenes inauguraram uma nova era
na roubalheira
institucional, um estilo absolutamente
despreocupado, totalmente descontraído. Usavam o telefone com a certeza de que
ninguém iria interceptar os seus diálogos mafiosos, afinal, Demóstenes era, na ficção que representava, um dos ícones da
moralidade pública, ocultando o cínico
completo, o desavergonhado sem limites.
No meio daquela promiscuidade toda, alguém, com uma réstia de comedimento, em meio
às comemorações frequentes pelo êxito da
quadrilha, usando o linguajar próprio da
escória de rufiões das sarjetas e dos palácios, menosprezando a gramática e invertendo o gênero do
champagne, da mesma forma como
avacalhavam a ética, poderia ter sugerido alguma precaução: ¨Menas champagne
gente boa ¨.
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